sexta-feira, 1 de março de 2013

Álvaro de Campos - Fernando Pessoa


É inútil prolongar a conversa de todo este silêncio.

É inútil prolongar a conversa de todo este silêncio.
Jazes sentado, fumando, no canto do sofá grande —
Jazo sentado, fumando, no sofá de cadeira funda,
Entre nós não houve, vai para uma hora,
Senão os olhares de uma só vontade de dizer.
Renovávamos, apenas, os cigarros — o novo no aceso do velho
E continuávamos a conversa silenciosa,
Interrompida apenas pelo desejo olhado de falar...
Sim, é inútil,
Mas tudo, até a vida dos campos é igualmente inútil
Há coisas que são difíceis de dizer...
Este problema, por exemplo.
De qual de nós é que ela gosta? Como é que podemos chegar a discutir isso?
Nem falar nela, não é verdade?
E sobretudo não ser o primeiro a pensar em falar nela!
A falar nela ao impassível outro e amigo...
Caiu a cinza do teu cigarro no teu casaco preto —
Ia advertir-te, mas para isso era preciso falar...
Entreolhámo-nos de novo, como transeuntes cruzados.
E o pecado mútuo que não cometemos
Assomou ao mesmo tempo ao fundo dos dois olhares.
De repente espreguiças-te, semi-ergues-te — Escusas de falar...
"Vou-me deitar!" dizes, porque o vais dizer.
E tudo isto, tão psicológico, tão involuntário,
Por causa de uma empregada de escritório agradável e solene.
Ah, vamo-nos deitar!
Se fizer versos a respeito disto, já sabes, é desprezo!
22-11-1931
Álvaro de Campos - Livro de Versos . Fernando Pessoa. (Edição crítica. Introdução, transcrição, organização e notas de Teresa Rita Lopes.) Lisboa: Estampa, 1993. 
 - 152.

TV PAGA

Estado de Minas - 01/03/2013


Enchendo a cara
O Telecine Premium estreia hoje, às 22h, a comédia Diário de um jornalista bêbado, com Johnny Depp (foto) no papel do repórter Paul Kemp. Cansado da rotina de Nova York, Kemp viaja para Porto Rico para trabalhar em um jornal local e acaba se apaixonando por Chenault (Amber Heard), noiva de Sanderson (Aaron Eckhart), um dos maiores empresários da cidade. Quando Kemp é recrutado para escrever um artigo favorável a uma empreitada fraudulenta, é confrontado com um dilema: deve ajudar Sanderson ou aceitar os riscos e denunciá-lo?

Muitas alternativas na
programação de filmes

No canal FX, hoje é dia de Sessão duplex, com dois filmes e um mesmo tema, no caso o resgate de vítimas de sequestro ou cárcere privado, com Refém (17h30) e Chamas da vingança (19h30). Na concorrida faixa das 22h,o assinante tem mais oito opções: O outro lado da rua, no Canal Brasil; A bela Junie, na Cultura; As aventuras de Tintim, na HBO; Felicidade, no Max; Charlotte Gray – Uma paixão sem fronteiras, no Glitz; Carga explosiva 3, na TNT; Sem vestígios, na Warner; e Louca obsessão, no TCM. Outras atrações: Projeto secreto – Macacos, às 20h15, no Telecine Cult; Heróis fora de órbita, às 21h, no Comedy Central; O ilusionista, no Cinemax; Era uma vez no México, também às 21h, no AXN; Amor e outros desastres, às 21h30, no Viva; e O último exorcismo, às 22h25, no Megapix.

Documentário revela os
bastidores de Hollywood


A Cultura reservou para hoje, à meia-noite, o documentário O outro lado de Hollywood, que aproveita clipes de clássicos do cinema e entrevistas com astros como Tom Hanks, Shirley MacLaine e Susan Sarandon para fazer uma acusação sutil ao sistema de Hollywood e a forma como ele sempre retratou a homossexualidade.

Marchlands chega ao fim
hoje no canal +Globosat


O +Globosat exibe hoje, às 22h, o quinto e último episódio da minissérie Marchlands. Em 1968, Paul pede para a chorosa Ruth deixar Marchlands com ele. Enquanto isso, em 1987, Eddie leva Amy ao túmulo de Alice e, em 2010, a devastada Ruth finalmente descobre o que aconteceu com sua filha tantos anos antes. Para quem não entendeu, a dica: a produção mostra como vivem os moradores de uma casa em três épocas diferentes.

Ciência explica truques
usados pelos ilusionistas


O Discovery estreia hoje, às 22h20, a série A ciência mágica, que vai revelar os princípios científicos por trás dos truques de mágica. Os nove episódios registram números surpreendentes apresentados por quatro jovens mágicos.

Boomerang apresenta
show do rapper Flo Rida


Para fechar, música. No canal Boomerang, às 15h, vai ao ar o Boombox all access com o rapper Flo Rida, conhecido por sucessos como Low e Whistle. Às 21h30, no Canal Brasil, a série O som do vinil reprisa o programa Pitty e seu projeto Chiaroscuro. E para celebrar o 19º aniversário do cantor pop Justin Bieber, o canal Bis apresenta, às 21h, o especial London live 2012 e, às 21h30, o documentário Justin Bieber: teen idol, enquanto o Telecine Fun exibe, às 22h, outro documentário, Justin Bieber – Never say never.

A cor do som - Ana Clara Brant‏

Oitavo disco do grupo e um dos mais conhecidos álbuns dahistória completa 40 anos e ainda desperta o interesse de músicos e fãs de todas as idades 


Ana Clara Brant

Estado de Minas: 01/03/2013 


Intuitivo e racional, misterioso, original, lírico, pretensioso, orgânico e místico. Não são poucas as tentativas de se definir o disco The dark side of the moon, obra-prima da banda inglesa Pink Floyd. Ao completar neste mês 40 anos de “viagem”, o álbum parece rejuvenescer a cada ano, ao ganhar novos fãs e ratificar sua mensagem aos admiradores mais antigos. Concebido pelas mentes estratosféricas de Roger Waters, David Gilmour, Rick Wright e Nick Mason, o famoso disco do prisma já nasceu grande ao propor um novo conceito musical, que explorava sons, imagens, abusava da tecnologia e propunha discussões políticas e filosóficas. Com o lançamento de seu oitavo trabalho, a banda atingiu a maturidade.

Conhecido até então como um grupo underground e psicodélico, que fazia um rock muitas vezes sem sentido e viajandão, o Pink Floyd quis definitivamente romper com o seu passado “lunático” e ser levado mais a sério. A ideia era clara: deixar para trás os traços sombrios do antigo guitarrista e fundador Syd Barret e estabelecer uma conexão mais direta com o público. “Queríamos trazer a banda de volta das fronteiras do espaço, sair daquela extravagância para algo que fosse mais claro, pessoal e menos subjetivo. Essa era a minha luta”, disse à época o baixista Roger Waters, então com 29 anos e cheio de dilemas com os quais tinha dificuldade em lidar.

O álbum seria o canal perfeito para promover sua catarse de amplitude universal. Tempo, violência, morte, ganância, medo e loucura eram apenas algumas das questões que o letrista exorcizou, jogando luz nas trevas da lua. “O disco trata de temas particulares de cada integrante do Pink, mas que são universais. Todos se identificam, pois as angústias ali colocadas são sentidas por toda a humanidade. Isso fez com que Dark side… não ficasse datado. Ele foi criado há 40 anos e continuará atual daqui a 100. O disco provou também que é possível fazer música de qualidade, com conteúdo e ainda vender muito”, analisa o jornalista e admirador do Pink Floyd Gustavo Miranda.

Gravado no lendário estúdio Abbey Road e lançado em março de 1973, em Londres, o disco – que teve o nome emprestado do verso da canção Brain damage, “I'll see you on ‘the dark side of the moon” – tornou-se um clássico de forma instantânea. Elogios de crítica e público atestaram que os músicos acertaram na forma e no conteúdo. Se por um lado o álbum revolucionava com o uso de sintetizadores e efeitos sonoros incomuns, por outro as letras disparavam impetuosas rajadas filosóficas. O vulcão sonoro que acabara de eclodir deu ao Pink Floyd o primeiro lugar nas paradas, vendas inimagináveis e a certeza de que a banda entrara com estilo no panteão do rock. “Lembro-me de que na primeira vez em que escutei o disco falei: ‘Nossa, isso é forte, é diferente.’ Este foi o disco que mudou a vida do Pink Floyd definitivamente. Eles saíram do underground para se transformar em estrelas do rock mundial”, acredita Bruno Morais, vocalista, guitarrista e diretor musical do Ummagumma The Brazilian Pink Floyd, grupo cover dos ingleses e que tem show marcado para o dia 16 em BH, no Palácio das Artes.

Divisor de águas da história floydiana, o emblemático Dark side… continua pulsante e atual. Inúmeras cópias são vendidas diariamente pelo planeta. Não bastassem suas músicas cheias de significados e enigmas, o álbum tem a capa que é, até hoje, uma das mais conhecidas da história do disco. Simples e direta, a imagem do prisma dá a exata noção do que se deve esperar ao experimentar os cerca de 43 minutos do álbum: a rica e edificante transformação da vida. E não nos esqueçamos de que não existe lado escuro da Lua. Na verdade, ela é toda escura.

Aos prantos Pink Floyd é muito mais do que a banda favorita para um grupo de fãs de Belo Horizonte. É motivo para viagens, reuniões e uma experiência. “A gente vira e mexe se encontra para ouvir e debater Pink Floyd. Já viajamos até para o exterior para ir ao show do Roger Waters e estamos pensando em criar um fã-clube aqui em BH”, comenta o economista Rodrigo Miranda ao lado dos amigos Rafael Máximo, Cristiano Halterberck, Luiz Gustavo Silva, Marcelo Colares e o irmão Gustavo. Os rapazes se acostumaram desde cedo a ouvir o som progressivo dos britânicos e acreditam que o Pink proporciona sempre algo único e supreendente. “É uma experiência psicológica, espiritual e musical. O Dark side… é um exemplo disso, porque é um disco enigmático e tem muita coisa acontecendo ao mesmo tempo”, resume o dentista Cristiano Halterberck. Já o economista Rafael Máximo se lembra de pedir ao padrinho colocar o ‘LP do triângulo’ para tocar quando tinha apenas 8 anos e, hoje, repete a história com o filho de 3 anos.

O amigo Luiz Gustavo Silva destaca que não só este disco como outros trabalhos da banda viraram referências para muitos artistas e grupos no mundo inteiro, inclusive do Brasil, como o próprio Clube da Esquina, O Terço, 14 Bis e Secos e Molhados. “Com certeza, eles foram influenciados e a gente vê essa sonoridade do Pink Floyd, inclusive do Dark side…, presente hoje em dia”, pontua.

Os amigos estiveram no show The dark side of the moon, apresentado por Roger Waters, no Rio de Janeiro, em 2007. O jornalista Gustavo Miranda saiu do show em transe e aos prantos. “Foi uma catarse. Chorei muito porque era a primeira vez que via o show da minha banda favorita. Era a realização de um sonho”, recorda.

Prisma mágico
The dark side of the moon tem uma das capas mais fortes e icônicas da história. O prisma decompondo o raio de luz em um espectro de cores é criação do designer Storm Thorgerson, que chegou a ir até o Egito para pesquisar o clima das pirâmides. No livro The dark side of the moon – Os bastidores da obra-prima do Pink Floyd, de John Harris, Thorgerson explica que a imagem representa tanto a diversidade como a clareza do som da música, e que o triângulo seria o símbolo da ambição, do poder e também da reflexão, temas com que Roger Waters se preocupava e que estão presentes no LP. “Além disso, acho que a imagem de um ponto singular refratando-se naquelas belas cores era também simbólico: de um grupo único saíam cores multíplices”, explicou o designer.

Números do disco

50 milhões
de cópias vendidas

250 mil
exemplares são vendidos a cada ano

741
semanas consecutivas (14 anos) nas paradas da Billboard

33%
dos ingleses têm The dark side of the moon em casa



Em busca da mesma emoção
Ana Clara Brant



Interpretar as 10 canções do álbum (Speak to me, Breathe, On the run, Time, The great gig in the sky, Money, Us and them, Any colour you like, Brain damage e Eclipse) é um desafio para qualquer banda ou músico, principalmente para os que se propõem a covers do Pink Floyd. Até porque, na época das gravações, The dark side of the moon incorporou as mais avançadas técnicas de estúdio, inovando em termos tecnológicos com o uso de sintetizadores e sons diferenciados como o looping de moedas caindo, pessoas gargalhando e batidas do coração.

O vocalista e guitarrista da banda Pink Floyd Reunion (PFR), Marcelo Canaan, diz que para o músico o disco não traz mais dificuldades técnicas do que os demais do Pink, porém o grande desafio é replicar sua sonoridade única. “Eles utilizaram teclados e uma aparelhagem enorme, que é muito antiga e hoje praticamente não existe. Não é fácil reproduzir esse som nos tempos atuais, por isso fazemos um trabalho de pesquisa de áudio e de som muito grande para chegar nessa sonoridade. Parte dos equipamentos que usamos é importada da Inglaterra ou de colecionadores. A outra parte é de simuladores, computadores e aparelhos mais modernos”, revela Marcelo, que, junto com o PFR, tem show marcado para dia 16, no Stonehenge Rock Bar.

A mesma preocupação é esboçada pelo líder da Ummagumma The Brazilian Pink Floyd, Bruno Morais. O vocalista e guitarrista da banda – que tem como logomarca três primas, já que são de Três Pontas e prestam uma homenagem não só à terra natal como à capa do The dark side…–, costuma se inspirar na frase dita por Roger Waters quando estava produzindo o disco: “Não tem nada de plástico nisso. É tudo guiado pela emoção”. “Estamos sempre buscando evoluir, tanto na parte musical quanto no visual dos shows. A sonoridade, os timbres, os efeitos sempre foram e ainda são uma das minhas maiores preocupações. Procuro me aproximar ao máximo do original. O desafio está em apresentar a mesma emoção presente no disco”, frisa. O Ummaguma também faz show no dia 16, no Palácio das Artes.

Mágico de Oz Uma das várias lendas que envolvem o disco é sua relação com O mágico de Oz. Quando o álbum é tocado simultaneamente com o filme, de 1939, ocorrem sincronizações entre as duas produções. O som da caixa registradora no princípio da faixa Money aparece exatamente quando Dorothy (Judy Garland) pisa pela primeira vez na estrada dos tijolos amarelos; que é também o momento em que o filme passa de preto e branco para colorido. Há outras correspondências no disco. Os integrantes do Pink Floyd sempre afirmaram que tudo não passa de coincidência. “É como se o filme fosse um clipe ambientado exatamente para o disco. Este ano, aproveitando os 40 anos do álbum, vamos tocar o disco na íntegra em alguns shows e colocar um telão no palco exibindo O mágico de Oz”, revela Marcelo Canaan, vocalista e guitarrista da Pink Floyd Reunion.



Momento histórico
Arthur G. Couto Duarte


Ainda que 1973 também tenha registrado a irrupção de obras-primas do porte de Lark’s tongues in a spic (King Crimson), Berlin, (Lou Reed), Tubular bells, (Mike Oldfield) Selling england by the pound (Genesis) e Raw power (Iggy & The Stooges), nenhum outro disco lançado ao longo daquele ano foi capaz de conquistar seu lugar nos anais do rock – e lá permanecer, incólume, como o intrigante e resoluto monólito sônico que ainda é – com a mesma força impactante de The dark side of the moon. Autêntico divisor de águas na trajetória do Pink Floyd, o disco se apropriaria da ideia do “álbum conceitual” embrionariamente aventada pelos Beatles em seu Sergeant Pepper’s Lonely Hearts Band para forjar uma fantástica criatura jamais vista ou ouvida até então.

Para além do icônico prisma e do feixe de luz branca a se refratar nas múltiplas cores que os designers visionários da Hipgnosis cravariam em sua capa, The dark side of the moon permaneceu no imaginário de seguidas gerações graças ao seu poder de síntese; a combinação idílica da experimentação avant-garde, arrojada instrumentação de ins(piração) lisérgica, pretensão sinfônica, inovação eletrônica e acessibilidade pop perseguida por Roger Waters, David Gilmour, Richard Wright, Nick Mason e o espectro louco de Syd Barrett desde quando irromperam pelo underground londrino, no início de 1966.
Ex-estudantes de artes plásticas e de arquitetura um dia tocados pelo desejo de criar “música em cores”, em Dark side... seus criadores finalmente conseguiriam dar plena vazão ao seu intento. Integrado a ponto de ser praticamente impossível imaginar qualquer uma de suas 10 faixas fora da sequência ou do contexto originais, o álbum literalmente incandesce enquanto justapõe temas de isolamento, estresse, medos cotidianos, ambição, envelhecimento, loucura e morte. Tudo imantado por inauditas técnicas de gravação e mixagem quadrafônicas, hipnóticos loops, rajadas de sintetizadores VCS3, reverberações espaciais, iridescentes solos de guitarra, arroubos de virtuosismo vocal, suntuosas passagens instrumentais ao gosto progressivo, efeitos delay e toda sorte de ruídos supostamente aleatórios.


Referenciando-se no inconsciente para jogar luz no “lado escuro” do ser humano, o oitavo álbum do Pink Floyd confirmou sua magnitude por meio de sucessivos relançamentos em incontáveis formatos que ultrapassaram 50 milhões de cópias vendidas. Tal sucesso sem precedentes custou caro ao grupo. Esvaziado pela concepção de Dark side..., Pink Floyd ainda se manteve de pé por algum tempo. Porém, a paranoia megalomaníaca de Roger Waters e disputas internas levariam à sua cisão, em meados de 1986. Triste ironia: nesta era de misantropia hi-tech em que a informação multimídia distribuída em rede por meio de pacotes e o download de músicas isoladas imperam sem maiores questionamentos, a mera constatação da permanência de um fenômeno musical da dimensão de The dark side of the moon talvez seja algo inconcebível para boa parte da humanidade.

Proteção natural contra o herpes - Bruna Sensêve‏

Proteína encontrada no corpo feminino barra a entrada de vírus transmitido durante as relações sexuais. Doenças bacterianas como a clamídia, responsável por casos de infertilidade feminina, também são evitadas 


Bruna Sensêve

Estado de Minas: 01/03/2013 

A descoberta de uma proteína produzida pelo corpo feminino pode ser o grande escudo de proteção contra infecções virais até então sem cura, como o herpes tipo 2, e doenças bacterianas com potencial devastador, como a clamídia. Um time de pesquisadores liderados por Ka Yee Fung e Niam Mangan, do Centro de Imunidade Inata e Doenças Infecciosas do Instituto de Pesquisas Médicas da Universidade Monash, na Austrália, publicou resultados nesse sentido na edição de hoje da revista científica Science. Apesar de os experimentos terem sido feitos ainda em camundongos, os autores acreditam que podem estar próximos do desenvolvimento das primeiras estratégias imunizantes contra ambas as doenças.

Denominada de interferon-, a molécula encontrada tem particularidades importantes cientificamente. De forma geral, o grupo de proteínas interferons pertence ao sistema imune inato do organismo, aquele que emite a primeira resposta de defesa quando percebe a invasão de algum agente infeccioso. No momento em que o patógeno é reconhecido, receptores da célula emitem uma sinalização para que seja induzida a produção do exército de interferons, que vão induzir o primeiro estado de resistência antiviral nas células ainda não contaminadas. O interferon- não segue o mesmo caminho. Em vez de ser produzido em situação de crise, ele está presente todo o tempo no tecido epitelial do trato reprodutivo das mulheres.

Também não é a presença de um agente infeccioso que controlará a sua manifestação. A quantidade de interferons- obedece às variações dos hormônios sexuais femininos, acompanhando as oscilações do ciclo menstrual. Logo após o período menstrual, o nível de progesterona é baixo e o de estrogênio, alto. Nessas condições, a expressão do interferon- é a mais alta. Essa taxa cai em 10 vezes na situação inversa, como na fase secretora do ciclo menstrual, em que a progesterona é alta e o estrogênio, baixo. Quando há a implantação de um embrião na parede do útero durante a ovulação, a produção dessa proteína chega a níveis quase nulos. Isso acontece porque a produção de estrogênio cai e dá espaço para a progesterona durante toda a gravidez. Baixas taxas de interferon- também são detectadas em mulheres após a menopausa. “Esses períodos em particular também parecem se correlacionar com aqueles em que elas ficam mais suscetíveis a doenças infecciosas”, analisa Fung. 

Análises em fêmeas de camundongo confirmaram que os interferons- agem diretamente na defesa do corpo contra ambas infecções. Fung acredita que, no futuro, poderá ser possível determinar as mulheres que estão mais ou menos expostas às doenças e como será a resposta delas a uma terapia específica. Para isso, no entanto, seria necessária uma estratégia capaz de medir a quantidade ou a competência dos genes que codificam essa proteína em um organismo. “Podemos ter implicações terapêuticas em que, ao administrar essa proteína, vamos proteger as mulheres contra a clamídia. As que mostrarem um pequeno potencial de produção (da proteína) também poderão fazer uso de um complemento ou ainda de outros tratamentos, como vacinas.”

Novas terapias O professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará José Eleutério Jr., também membro da Academia Internacional de Citologia, destaca que características similares também foram estudadas para outros grupos de proteína, como a MBL (Mannose-biding Lecitin) em estudos de Steven Witkin, da Universidade de Cornell, em Nova York. “Witkin demonstrou que infecções genitais em humanos seriam mais frequentes entre pessoas com uma alteração genética associada a uma redução da ação dessa proteína natural.” Ele salienta que os dois estudos, mesmo abordando elementos diferentes, têm uma característica comum quanto ao risco. “Mais do que uma abordagem terapêutica, está em jogo a identificação de indivíduos que teriam necessidade de rastreio e de diagnóstico mais precoce de infecções, além de uma abordagem preventiva mais intensa”, conclui.
José Eleutério considera a pesquisa promissora e com potencial para esclarecer questões sobre as respostas imunológicas individuais e para desenvolver novas abordagens contra infecções. No entanto, segundo ele, falar em cura para o herpes tipo 2 ainda é improvável. “Espera-se que a evolução dos conhecimentos permita que um dia essa resposta possa ser positiva. Mas os experimentos com o interferon- começaram agora. Os demais interferons têm tido resultados pouco promissores em ensaios clínicos”, avalia. Ele lembra que o vírus da herpes tem como principal característica ficar “escondido” em um gânglio neural localizado na área em que haverá lesão na pele. Desse jeito, torna ainda mais difícil o tratamento com drogas terapêuticas, pois nem sempre eles alcançam o patógeno. 

O herpes tipo 2 não tem cura. O tratamento atual consiste na contenção de crises com antivirais. Ainda assim, o vírus não é um grande vilão, já que não existem grandes complicações, apenas um incômodo doloroso e estético. A clamídia, por sua vez, acomete milhões de mulheres e pode chegar a comprometer seriamente o sistema reprodutivo feminino, levando à esterilidade. “Ela é muito esquecida por pacientes e médicos brasileiros por ser, na maioria das vezes, assintomática, em especial em infecções genitais na mulher”, avalia Eleutério. Ele estima que entre 6% e 20% das mulheres possam estar nesse momento infectadas e sem saber. “Embora em países desenvolvidos seja hábito o rastreio de clamídia, no Brasil isso não é feito.”

A ginecologista Yara Furtado de Melo, secretária da Comissão Nacional Especializada em Doenças Infecciosas em Ginecologia e Obstetrícia da Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), explica que a infecção se inicia no colo do útero e pode subir até a tuba uterina sem que haja qualquer manifestação clínica ou sintoma característico. Esse é uma das razões pela qual o rastreamento da doença fica reservado a mulheres grávidas ou àquelas com dificuldade de engravidar. “É uma doença silenciosa que sobe e pode comprometer o desenvolvimento do feto. Também recebemos muitas mulheres com dificuldade de engravidar que fazem o exame e descobrem que as trompas foram obstruídas pela ação da bactéria”, descreve.
Na gravidez, as consequências podem ser drásticas, como abortamento, trabalho de parto prematuro, morte neonatal ou infecções pós-cirúrgicas. O problema, na maioria das vez, pode ser revertido, exceto em casos muito graves. “A trompa uterina tem um epitélio muito fino e, se estiver muito destruído pela infecção, não pode ser recuperado”, explica a ginecologista. 

Helio Schwartsman

folha de são paulo

Esteira de eufemismos


SÃO PAULO - Como minha caixa de mensagens continua atulhada de e-mails a propósito da polêmica homossexualismo x homossexualidade, resolvi dedicar mais uma coluna ao tema. Prometo que é a última.
Não tenho nada contra a variante homossexualidade e me disponho a adotá-la tão logo os militantes parem de denegrir o sufixo "-ismo", que, ao contrário de "-astro", não encerra nada de pejorativo. Acredito, porém, que essa substituição de nomes é, muito provavelmente, um exercício fadado ao fracasso.
O pressuposto do patrulhamento linguístico é o de que palavras insidiosamente moldam atitudes, o que torna necessário manter vigilância constante contra formas sutis de ofensa. Embora haja nas humanidades quem ainda sustente essa tese, ela foi já há muito abandonada pelas ciências cognitivas. Nesse modelo, o que ocorre é exatamente o contrário. São as ideias das pessoas, incluindo seus preconceitos, que influenciam a linguagem, originando o fenômeno que o psicólogo Steven Pinker apelidou de "esteira de eufemismos".
A palavra "alcoólatra", por exemplo, foi proposta no início do século 20 para substituir "bêbado" e seus sinônimos mais vulgares, com o objetivo de reduzir um pouco a carga negativa que pesava contra essas pessoas. É óbvio, porém, que a permuta de nomes não fez com que os alcoólatras parassem de beber, de modo que o novo termo logo foi contaminado pelas mesmas mazelas que o fizeram surgir. Em pouco tempo, foi trocado por "etilista", "alcoólico", "dependente químico". A lista é aberta.
Algo parecido aconteceu com o "de cor", que substituiu "crioulo", para depois dar lugar a "preto", "negro" e "afro-brasileiro".
Pinker diz que a esteira de eufemismos é a melhor prova de que são os conceitos --e não as palavras-- que estão no comando. Em vez de combater nomes, deveríamos nos concentrar nas atitudes, que são, afinal, o que se deseja mudar.
Hélio Schwartsman
Hélio Schwartsman é bacharel em filosofia, publicou "Aquilae Titicans - O Segredo de Avicena - Uma Aventura no Afeganistão" em 2001. Escreve na versão impressa da Página A2 às terças, quartas, sextas, sábados e domingos e às quintas no site.

Mônica Bergamo


folha de são paulo

Investimentos via Lei Rouanet ficaram estagnados em 2012


Os investimentos via Lei Rouanet ficaram estagnados em 2012: foi captado R$ 1,23 bilhão, contra R$ 1,25 bilhão em 2011. E diminuiu o número de projetos apoiados: de 3.516 para 3.398, segundo balanço fechado ontem.
RETIDO NA FONTE
O Ministério da Cultura diz que a ligeira redução de investimento "é uma questão de mercado, envolvendo empresas e promotores culturais". E que a queda de projetos foi causada por "mudanças no processo de autorização, para aumentar a eficiência e a economicidade".
DEU E GANHOU
A Petrobras foi a maior investidora da Rouanet, com R$ 80 milhões. A Vale (R$ 40 milhões) e o Banco do Brasil (R$ 39 milhões) vêm na sequência. O Itaú Cultural lidera o ranking dos que mais receberam recursos, com R$ 22 milhões, seguido da Bienal de SP (R$ 10,7 milhões).
HISTÓRIA
O ministro Ricardo Lewandowski enviou o livro "A Outra História do Mensalão", de Paulo Moreira Leite, para as bibliotecas do STF (Supremo Tribunal Federal) e da USP. Ele acha que o material, que critica a condução do julgamento e diz que ele foi contraditório, político e, em vários aspectos, injusto, será precioso para o estudo de historiadores no futuro.
HISTÓRIA 2
Lewandowski gostou especialmente do prefácio do colunista da Folha Janio de Freitas, de quem se diz "admirador". Entre outras críticas, o jornalista diz que a imprensa e seus analistas, "com exceções raras", passaram do comentário jornalístico para texto "típico da finalidade política" e de "indisfarçável facciosismo".
HISTÓRIA 3
E o ministro ainda não leu o livro "Mensalão - O Dia a Dia do Maior Julgamento da História Política do Brasil", do jornalista Merval Pereira, de "O Globo" --que considera o processo "um balanço extremamente positivo para a democracia brasileira". A obra tem prefácio de Carlos Ayres Britto, ex-presidente do STF, de quem Lewandowski divergiu na maior parte dos votos. O livro será lançado na segunda, em São Paulo.
PIANO AO AR LIVRE
A primeira-dama da cidade, Ana Estela Haddad, e o empresário David Feffer, acompanhado de Julie Lamac, assistiram ao show de Elton John, na quarta-feira (27), no Jockey. Também circularam pelo camarote JK Iguatemi o cineasta Fernando Meirelles com a mulher, Ciça, a empresária Iara Jereissati, a diretora do SBT Silvia Abravanel, filha de Silvio Santos, e Edu Pedroso.

Famosos vão a show de Elton John

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Zanone Fraissat/Folhapress
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O cineasta Fernando Meirelles e a mulher, Ciça, foram ao show do cantor Elton John em São Paulo, na quarta (27)
O ARTESÃO E A HERDEIRA
Adriano Vizoni/Folhapress
Savério Silvarolli, 75, aprendeu o ofício de sapateiro com o avô italiano há mais de 50 anos. Ele continua cortando e montando os sapatos que levam a marca Corello, empresa familiar na qual a filha Carla é diretora de criação e marketing.
BOM DEMAIS
Durante conversa privada com 20 investidores em Nova York, anteontem, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ouviu que o mínimo de 10% reais ao ano de taxa de retorno para os projetos de concessão no Brasil seria baixo. Respondeu com uma pergunta: "Em que parte do mundo se obtém uma taxa de retorno como essa para poder aplicar um dinheirinho que se tem guardado?".
SOLIDÁRIO
Gabriel Chalita (PMDB-SP) está recebendo solidariedade do PT por causa das denúncias de irregularidades na Secretaria da Educação. Especialmente do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, com quem tem conversado.
UM MILHÃO
A Mauricio de Sousa Ao Vivo, empresa responsável pelos shows e eventos da Turma da Mônica, ultrapassou em dois anos a marca de um milhão de espectadores. O marco foi com o espetáculo "Mônica Mundi", em cartaz em SP. Em abril, o grupo estreia no teatro Geo o musical "Mônica e Cebolinha no Mundo de Romeu e Julieta".
EM SILÊNCIO
A vida da escultora francesa Camille Claudel renderá nova peça. Patrícia Pillar e Eliane Giardini estarão no elenco de "Uma Conspiração do Silêncio", sobre os 30 anos em que a amante de Auguste Rodin passou internada, com problemas mentais, antes de morrer, em 1943. A relação entre Camille e sua mãe é um dos focos, afirma o diretor Amir Haddad.
SEM CENSURA
Alexandre Frota volta à TV na segunda, no canal Rede Brasil, que tem Celso Russomanno no conselho. "Tenho total liberdade. O Russomanno é um homem de TV e sabe que, assim como ele, sou formador de opinião", diz. Com contrato de quatro anos na emissora, Frota desenhou o cenário da atração e tem salário de R$ 1.000 mais participação nos lucros.
POESIA NA PAULISTA
O escritor Ferreira Gullar lançou o livro "Arte Contemporânea Brasileira", no Itaú Cultural. A atriz Carolina Manica e o poeta Thiago Zanotti estavam na fila de autógrafos.

Ferreira Gullar lança livro na Paulista

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Zanone Fraissat/Folhapress
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O escritor e colunista da Folha Ferreira Gullar lançou o livro "Arte Contemporânea Brasileira", em São Paulo, na segunda (25)
CURTO-CIRCUITO
Paulo Gustavo estreia nesta sexta-feira (1º) o espetáculo "Hiperativo", às 21h30, no teatro Procópio Ferreira. 12 anos.
Marcelo Knopfelmacher foi reeleito presidente do MDA (Movimento de Defesa da Advocacia).
A festa Santo Forte acontece nesta sexta-feira (1º) no clube Piratininga, às 23h. 18 anos.
Mônica Bergamo
Mônica Bergamo, jornalista, assina coluna diária publicada na página 2 da versão impressa de "Ilustrada". Traz informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999.

José Simão


folha de são paulo 
Timão! Vai uma liminar aí, mano?
E diz que a Portuguesa exige punição igual à do Corinthians. Pra ter quatro torcedores no estádio!
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do Planeta da Piada Pronta: "Advogado de acusação boliviano diz que vai provar que o corintiano acusado é inocente". E o advogado de defesa quer provar que o cliente é culpado! Reviravolta no mundo jurídico!
E a manchete do Piauí Herald: "PT apresenta menor de 17 anos como responsável pelo mensalão". A moda do "de menor" pegou!
E agora a maior diversão do brasileiro: zoar com o Corinthians! Adorei Corinthians X Millonarios! Maloqueiros X Milionários! Sem torcida. Portões fechados! "Corinthians vence com apoio de quatro torcedores." Que conseguiram liminar! Torcedor ficha limpa! Rarará!
E o Corinthians já botou à venda 10 mil liminares pro próximo jogo. Vai ter cambista vendendo liminar na porta do estádio! "Vai liminar aí, mano? Dez real!" E qual o problema de jogar sem torcida? O Santos também joga. Aliás, o site CornetaFC mostra o repórter perguntando ao Cássio: "Cássio, como foi jogar sem torcida?". E o Cássio: "Agora eu sei como a torcida do Santos se sente na Vila". Solitários!
E diz que a Portuguesa exige punição igual à do Corinthians. Pra ter quatro torcedores no estádio! E como disse um amigo no Twitter: "Torcida do Botafogo pensa que também foi punida e não comparece ao estádio desde 1907!". Rarará!
E sorte da mãe do juiz que não teve torcida! Aliás, o Galvão devia ter narrado o jogo. Sem torcida, não ia ter aquele famoso coro: "Ei, Galvão, vai tomar no fiofó!". Rarará! E já imaginou aqueles quatro torcedores num estádio vazio? "Pô, mano, não empurra!" "Chega pra lá, caraio, não vê que eu tô apertado?"
E esta: "Lula se compara a Lincoln". Só se for com o Lincoln Town da Ford: bebe muito, faz muito barulho e não anda nada! Rarará!
E antes não era com Napoleão que os maluquetes se comparavam? Lembra daquelas piadas antigas com o louco com a mão dentro do paletó, dizendo: "Eu sou Napoleão!". Rarará!
Aliás, Lula e Lincoln têm um ponto em comum: Lincoln era mensaleiro! Aliás, alguns colunistas escrevem que Lincoln usava de práticas políticas pouco heterodoxas. Tradução: Mensalão! Mensalation! Rarará!
E adorei esta pichação num muro em Araranguá, Santa Catarina: "A morte é uma coisa que acaba com a vida de um cara". Rarará! Nóis sofre, mas nóis goza! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

    Barbara Gancia


    folha de são paulo
    A ex-mulher de James Cameron
    Por que será que fato de relevância histórica no filme de Bigelow foi totalmente ignorado pela imprensa?
    CHEGUEI AO interior da sala de exibição de "A Hora Mais Escura", o filme de Kathryn Bigelow que causou no Oscar, sem saber que seria arrebatada por uma grata surpresa.
    Se tenho um defeito é o de viver em descompasso com as novidades. Teria de ser mais antenada para não decepcionar o público, mas a brevidade do dia aliada à minha incapacidade funcional impedem que me mantenha atualizada. Quando vou ao cinema, todo mundo e seu vizinho vêm me contar sobre o filme e comentar o que não quero saber. Vivo para aquele momento de mistério bem no início da sessão, em que o escuro da tela se transforma em espetáculo.
    Passou um bom tempo desde o momento em que "A Hora Mais Escura" entrou em cartaz até o dia em que fui assistir ao filme. Nesse ínterim, não teve jeito de fugir da repercussão. Foram vários os assuntos trazidos à tona. Se Bin Laden usou a mulher de escudo, se a história foi contada à risca, mas, sobretudo, se torturador é tudo igual e só muda de endereço.
    A gente se lembra como a expressão "Guerra ao Terror" causava ojeriza, inclusive pela conotação mercadológica. Hoje, o distanciamento faz perceber -e o filme mostra- que a terminologia se fazia necessária para que dispositivos legais fossem colocados em prática a fim de driblar a burocracia, agilizar a aprovação de orçamentos exorbitantes e viabilizar interrogatórios, já que leis de exceção só podem ser usadas em períodos de guerra. De que outra forma seria possível lidar com terroristas dispostos a se explodir com toneladas de dinamite amarradas ao corpo? Era uma corrida contra o tempo.
    Entre outros, o filme pautou um perfil que li na "Esquire", do oficial da Marinha, o "Navy Seal", que deu os três tiros fatais em Bin Laden. Sujeito está chateado porque jamais será reconhecido publicamente e não levou os US$ 25 milhões da recompensa. Consola-o uma lenga-lenga de ter sido "ungido por Deus" para a missão.
    Reportagens sobre o Oscar descreviam "A Hora Mais Escura" como "caçada a Bin Laden". Na visão de dois dos maiores galãs desta nossa Folha, o que chamou atenção foi a tortura. Existirá tortura do bem e do mal? Poderia ser justificada a que serve para salvar uma criança sequestrada? O dilema pode ser instigante. Melhor ainda quando, no papel do torturador, você coloca um Denzel, um Indiana Jones ou o Clint, não? Mas acho que já vi essa versão em DVD...
    Outro ser pensante do jornal questiona se um Estado que recorre sistematicamente à tortura merece ser justificado diante de situações que, muitas vezes, ajudou a criar. Bem, eu rebateria perguntando se ele tem automóvel, troca os pneus, anda de avião, possui eletrônicos e faz exames clínicos. Se a resposta for positiva, seu próprio estilo de vida terá fornecido a resposta à sua pergunta.
    Agora voltando à grata surpresa sobre o filme de Kathryn Bigelow de que falava lá no começo e a quem chamei de "mulher de James Cameron" -talvez você nem tenha se dado conta, apenas como forma de provocação; a esta altura, é ele quem deveria se apresentar como ex-marido dela.
    Em nenhuma crítica ou resumo que eu tenha visto por aí há qualquer menção ao notável fato de que foi uma mulher, uma jovem analista da CIA atuando em seu primeiro emprego, a responsável por encontrar Bin Laden depois de dez anos de busca. Não fosse a bravura e a competência da agente Maya, Bin Laden ainda estaria explodindo civis inocentes pelo mundo. Por que será que o fato, de relevância histórica, não interessou minimamente a ninguém?

    Bob Wilson seleciona brasileiros para seu próximo espetáculo


    folha de são paulo
    Bete Coelho e Lígia Cortez estão entre os convidados a atuar em "A Dama do Mar"
    GUSTAVO FIORATTIDE SÃO PAULOO diretor norte-americano Bob Wilson convidou, no início desta semana, cinco atores brasileiros a atuarem em seu próximo espetáculo teatral, uma montagem para o texto "A Dama do Mar", da dramaturga norte-americana Susan Sontag (1933-2004).
    O espetáculo será produzido em São Paulo, mas sua estreia será realizada em Santos, no dia 16 de maio, em uma unidade do Sesc.
    A temporada de "A Dama do Mar" na capital paulista terá início no dia 24 de maio, no Sesc Pinheiros, e a peça permanecerá seis semanas em cartaz. Há possibilidade de que circule por outras cidades brasileiras e fora do país, segundo o próprio Sesc.
    Na lista de atores convidados a trabalhar com Wilson, estão Bete Coelho, Luiz Damasceno, Hélio Cícero, Ondina Castilho e Lígia Cortez.
    O convite já foi formalizado, mas os contratos ainda não foram fechados, e poderá haver mudanças. Segundo o Sesc, mais um ator será escolhido para completar o elenco do espetáculo.
    Conduzido pelo próprio Wilson, o processo de seleção foi realizado no início da semana passada, no Sesc Bom Retiro. Entre os atores que passaram pela bateria de testes estavam Maria Luísa Mendonça, Leopoldo Pacheco e Juliana Galdino.
    DAMA DO MAR
    O texto escolhido por Wilson é uma adaptação de uma peça homônima do norueguês Henrik Ibsen (1828-1906), sobre uma mulher que se casa com um homem e passa a fazer parte de sua família, convivendo também com suas filhas. Ela esforça-se para amá-lo, mas permanece ligada a um antigo romance com um marinheiro.
    A peça de Sontag já foi encenada por Wilson anteriormente, em 1998. Na montagem brasileira, a protagonista será interpretada por Ondina Castilho e Lígia Cortez.
    Desde o ano passado, Wilson tem se aproximado do público brasileiro. Quatro produções suas estiveram em São Paulo desde abril. Entre elas, foram apresentadas "Ópera de Três Vinténs", de Bertolt Brecht, e "Lulu", de Frank Wedekind, além da ópera "Macbeth", de Giuseppe Verdi, no Municipal.

      OS ESCOLHIDOS
      Peça estreia em maio
      Bete Coelho -Trabalhou com Antunes Filho, Gerald Thomas e Zé Celso
      Lígia Cortez - Atuou com o pai, Raul Cortez, em "Rei Lear"
      Ondina Castilho - Está em cartaz em "Toda Nudez Será Castigada", de Antunes Filho
      Hélio Cícero - É um dos fundadores da cia. Arnesto Nos Convidou
      Luiz Damasceno - Atuou na Ópera Seca, de Gerald Thomas

        Michel Laub

        folha de são paulo

        Hollywood e moral
        "O Voo" e "O Lado Bom da Vida" iluminam outro dos paradoxos hollywoodianos, no campo dos costumes
        Alguns termos usados pela crítica de cinema são curiosos. Um deles é "hollywoodiano" como sinônimo de visão de mundo conservadora -a favor da ordem, do capitalismo, do sentimento patriótico, da família tradicional.
        Digo isso porque Hollywood não é uma corporação monolítica, e sim a indústria que lança dezenas de filmes por ano, para diversos nichos de público, e até por lógica comercial precisa lidar com as ideias e os valores de cada época -tanto de maneira ufanista quanto desconfiada.
        Um exemplo moderno: difícil haver história sobre políticos, detetives, jornalistas e promotores em que a chefia não seja desmascarada, revelando a estrutura corrompida em governos, polícia, imprensa e justiça. O tema do indivíduo em luta contra a opressão coletiva, tão velho e americano, é realmente a favor do sistema representado por essas instituições? E como uma cultura imperialista, sempre acusada de estimular o conformismo mundo afora, tem como base justamente o pé atrás em relação à autoridade?
        Dois filmes em cartaz iluminam outro dos paradoxos hollywoodianos, desta vez no campo dos costumes. O primeiro é "O Lado Bom da Vida", de David O. Russell, que trata das idas e vindas de um casal com transtornos psiquiátricos (Bradley Cooper e a ótima Jennifer Lawrence). O segundo é "O Voo", de Robert Zemeckis, sobre um piloto alcoólatra (o também ótimo Denzel Washington) que vira herói ao salvar vidas num desastre aéreo.
        Depois de assistir a ambos, fica a pergunta: o que é ser a favor do "status quo" quando se conta uma história sobre conduta privada? O padrão atual em comédias românticas, caso de "O Lado Bom", é o do sujeito contido, entediado pelo conforto matrimonial e profissional, que se apaixona por mulher instável, viaja para país exótico ou se matricula em curso de dança para, aí sim, descobrir seu verdadeiro eu.
        No polo oposto, o de filmes como "O Voo", é inevitável que o farrapo humano destruído por roleta, garrafa, seringa e vídeos acabe confessando que precisa de ajuda, numa catarse de lágrimas que aponta para a salvação na existência regrada, "normal".
        Ocorre que é difícil julgar as intenções de uma narrativa. Mostrar uma situação não significa concordar com ela. Mesmo que o desfecho aponte claramente para um lado, a forma como se chegou até ele -por causa de ambientação, dramaturgia, carisma dos atores- pode indicar o contrário.
        Assim, em "O Voo", há mais lamento pelos males do alcoolismo ou celebração indireta dos excessos, na lógica romântica (e sessentista) que os identifica com inteligência, criatividade ou resposta à hipocrisia de uma sociedade cheia de normas, tudo ao som de "Gimme Shelter"?
        Já em "O Lado Bom", o sentido é o da aceitação de diferenças, no qual simpatizamos com os desajustados, ou falta o requisito básico para a empatia -o conhecimento realista do que é o drama dos distúrbios mentais, tratados por Russell com uma leveza algo turística?
        Nesse ponto sempre ambíguo de interpretação, a crítica pode enxergar o que quer. Prefiro pensar que um filme tem autonomia: guardadas as óbvias exceções, inclusive a do "cinema de tese", sua primeira tarefa é seguir a lógica do enredo e dos personagens. Mesmo que trate de moral em algum nível, como faz qualquer descrição de atos humanos, a trama muitas vezes pode passar ao largo desse debate.
        É o caso de "O Voo" e "O Lado Bom", em que possíveis conclusões na área são só um detalhe. No primeiro, melhor prestar atenção no virtuosismo do acidente recriado, em seus desdobramentos afetivos e institucionais, na galeria de tipos (o traficante, a viciada) que gravita em torno de Denzel Washington. No segundo, é a direção -de atores, em especial- que faz vibrar um roteiro irregular, em que cenas surpreendentes são melhores que o todo previsível.
        Se um filme não pudesse ser visto assim, nunca teríamos chance de gostar ou concordar com o que antes parecia errado. Ou seja, uma história seria boa ou ruim à medida que confirmasse ou não nossas certezas -ideológicas, estéticas, morais. É uma concepção estreita de arte. E sinal de conservadorismo, agora no pior sentido da palavra.